Nada dos uniformes vermelhos. Nada de algemas ou agentes penitenciários armados guardando as celas e a entrada. A disciplina ali é na base da confiança, nas pessoas e no sistema. Entrei na APAC Nova Lima guiada pelo José Antônio Junio Silva, um simpático recuperando de 32 anos, que estava vestido em seus trajes sociais, não para me receber, mas para sua lida diária em uma das divisões do setor administrativo da instituição.

Dentro da APAC, 90% dos serviços são realizados por quem cumpre pena lá. Os trabalhos administrativos, a horta, a marcenaria, a cozinha e a padaria contam com as habilidades de mãos que antes foram usadas no mundo do crime.

Mais do que manter os recuperandos ocupados durante o dia e gerar renda para sustentar a instituição, as atividades buscam dar àqueles homens uma profissão, um ofício. Em cada um dos trabalhos, eles são treinados e alocados de acordo com suas aptidões.

Além de oferecer essas opções de trabalho, a APAC ainda fomenta os projetos criados pelos próprios rapazes que vivem lá. Franklin Harley Pereira, 35, por exemplo, ganhou uma oficina onde ele constrói seus móveis em madeira de demolição, muito bem feitos, por sinal. Outro projeto que chama atenção é o coral da APAC, que conta com 13 homens mais o maestro, que também é um recuperando e lidera com muita propriedade a afinada cantoria dos rapazes. Eles ainda vão lançar seu primeiro CD em abril, com canções em português, inglês, italiano e espanhol.

Junio me conta um pouco da sua experiência dentro da APAC com um orgulho visível do homem em que o método criado por Mário Ottoboni o transformou. Pai de uma menina de nove anos, ele cursa Administração a distância e ressalta a educação como pedra angular no processo de recuperação, além da amizade, da leitura e do perdão a si mesmo.

Me despeço de Junio e conheço Douglas Teixeira Faria, que é casado há 17 anos e pai de três filhos, uma família da qual se orgulha e pela qual busca sempre melhorar. Douglas me apresenta o espaço que abriga o regime fechado e conta com orgulho sobre os 512 dias de paz até aquele dia.

As celas onde os rapazes vão apenas para dormir em nada se parecem com as vistas no sistema comum. As camas com seus lençóis esticados e as roupas e pertences organizados em uma estante ficam em um ambiente limpo e totalmente digno.

Douglas ainda me conta sobre seu desejo de cursar a faculdade a distância, assim como Junio já faz, e sobre sua constante luta para matar o criminoso dentro de si. “Aqui eles nos ensinam que temos um tigre e um cordeiro dentro de nós. O que vai definir nosso comportamento é qual dos dois escolhemos alimentar”, afirma.

Tanto para Junio quanto para Douglas, a sociedade deve receber um homem melhor do que aquele que foi preso. “Quando nós cometemos um crime e somos presos, perdemos o direito de ir e vir, esse sim eu concordo que nos deve ser tirado. Mas ainda sim continuamos humanos, e o direito à humanidade e à dignidade não nos pode ser negado”, afirma Junio.

Por Daniele Franco, estudante de Jornalismo e colaboradora do portal Sou BH. Confira a matéria na íntegra clicando aqui.

Categories:

Tags:

Comments are closed

SITE TEMPORÁRIO: Nosso site está em processo de migração e melhorias.

Se quiser ser avisado das novidades insira seus dados aqui:

X